Governo Trump anuncia novas sanções contra brasileiros 11 dias depois da condenação de Jair Bolsonaro
Reprodução/TV Globo
O governo americano aplicou nesta segunda-feira (22) sanções à mulher do ministro do STF Alexandre de Moraes usando a Lei Magnitsky, que prevê punições econômicas a pessoas que violam os direitos humanos.
O Departamento do Tesouro explicou assim a sanção:
“Viviane está sendo sancionada por ser, ou ter sido, líder ou funcionária do Instituto Lex.”
O documento afirmou:
“O Instituto Lex está sendo punido por ter patrocinado ou fornecido apoio financeiro, material ou tecnológico, bens ou serviços em apoio a Moraes — cujos bens e interesses patrimoniais estão bloqueados de acordo com essa lei.”
Com isso, todos os bens de Viviane, que estejam nos Estados Unidos ou em posse ou sob controle de empresas ou instituições americanas, ficam bloqueados. Ela também está proibida de realizar transações com empresas ou bancos americanos. E foi banida de entrar em território americano. O visto dela já tinha sido suspenso em julho.
Essa lei foi sancionada em 2012, no governo do presidente Barack Obama, e batizada em homenagem ao advogado russo Sergey Magnitsky. Ele morreu na prisão depois de revelar um mega esquema de fraude fiscal entre autoridades russas. A lei puniu os responsáveis pela prisão de Magnitsky. Alguns anos depois, passou a ser aplicada no mundo todo, contra indivíduos e organizações acusados de cometer graves violações de direitos humanos e corrupção.
A lista inclui ditadores como Aleksandr Lukashenko, presidente de Belarus, no poder há 31 anos e reeleito em janeiro em eleições não reconhecidas pela União Europeia. Os filhos e a mulher dele, também.
Sobre a decisão desta segunda-feira (22), o secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Scott Bessent, declarou em nota: “O Tesouro vai continuar a ir atrás de indivíduos que fornecem apoio material a Alexandre de Moraes enquanto ele viola os direitos humanos.”
Questionado sobre a aplicação da lei a Viviane Barci de Moraes, Bessent disse que “não há Clyde sem Bonnie” – uma referência ao casal de assaltantes que praticou uma onda de crimes nos Estados Unidos nos anos 1930.
O secretário de estado americano, Marco Rubio, afirmou que “essas sanções se baseiam em uma série de ações tomadas pelo Governo Trump para responsabilizar Moraes por abuso de autoridade, criação de um complexo de censura, ataque flagrante a oponentes políticos e prática de graves violações de direitos humanos. Aqueles que protegem e permitem que atores estrangeiros como Moraes ameacem os interesses dos Estados Unidos também serão responsabilizados.”
Um dos coautores da Lei Magnitsky, o deputado democrata James McGovern, já criticado a aplicação da lei como instrumento político do governo Trump. Nesta segunda-feira, o porta-voz do deputado disse em nota que Donald Trump está usando a lei para proteger aliados políticos no Brasil, que tentaram derrubar violentamente seu próprio governo.
O gabinete declarou que as sanções são arbitrárias — e representam uma inversão vergonhosa da Lei Magnitsky — que vão corroer ainda mais os padrões da democracia e do Estado de Direito nos Estados Unidos e em todo o mundo.
O anúncio das sanções era esperado desde 11 de setembro, quando a Primeira Turma do STF condenou Jair Bolsonaro a 27 anos de prisão por liderar a tentativa de golpe. O filho dele, Eduardo, esteve várias vezes na Casa Branca, também nos Departamentos do Tesouro e de Estado antes mesmo da condenação para pedir a autoridades americanas a aplicação das sanções contra Alexandre de Moraes e outros envolvidos no julgamento. Eduardo também pediu o cancelamento de vistos de autoridades brasileiras.
Nesta segunda-feira (22), o Departamento de Estado anunciou a revogação dos vistos de sete autoridades brasileiras e seus parentes – inclusive o advogado-geral da União, Jorge Messias. A chefe de gabinete de Alexandre de Moraes, Cristina Yukiko Kusahara Gomes; o ex-advogado-geral da União José Levi; os atuais e ex-integrantes do gabinete do ministro Alexandre de Moraes no Tribunal Superior Eleitoral e no Supremo Tribunal Federal, os juízes Airton Vieira, Marco Antonio Martin Vargas e Rafael Henrique Janela Tamai Rocha; além do ministro do Superior Tribunal de Justiça, Benedito Gonçalves, que foi relator da ação que tornou Bolsonaro inelegível no TSE por abuso de poder político e uso indevido de meios de comunicação.
As reações no Brasil foram imediatas e de condenação às novas sanções do Governo Trump.
O Ministério das Relações Exteriores divulgou nota em nome do Governo Brasileiro, que disse receber “com profunda indignação, o anúncio, pelo governo norte-americano, da imposição da Lei Magnitsky à esposa do ministro Alexandre de Moraes e a instituto ligado a ele. Em nova tentativa de ingerência indevida em assuntos internos brasileiros, o governo norte-americano tentou justificar com inverdades a adoção da medida, no comunicado divulgado na manhã de hoje.”
O Itamaraty declarou ainda que a atitude “representa a politização e o desvirtuamento na aplicação da lei” e que “esse novo ataque à soberania brasileira não logrará seu objetivo de beneficiar aqueles que lideraram a tentativa frustrada de golpe de Estado, alguns dos quais já foram condenados pelo Supremo Tribunal Federal. O Brasil não se curvará a mais essa agressão.”
O Supremo Tribunal Federal também reagiu às sanções aplicadas contra a esposa do ministro Alexandre de Moraes. Em uma nota institucional, o STF afirmou que as medidas são “lamentáveis e injustas”.
A nota diz: “Infelizmente, as autoridades norte-americanas foram convencidas de uma narrativa que não corresponde aos fatos: estamos diante de um julgamento que respeitou o devido processo legal e o amplo direito de defesa, com total publicidade. No Brasil, a quase totalidade da sociedade reconhece a importância histórica de um julgamento e punição por uma tentativa de golpe de Estado.”
E finaliza: “Se já havia injustiça na sanção a um juiz pela sua atuação independente e dentro das leis e da Constituição, ainda mais injusta é a ampliação das medidas para um familiar do magistrado.”
O ministro Alexandre de Moraes, que já é alvo das mesmas sanções, afirmou: “A ilegal e lamentável aplicação da Lei Magnitsky à minha esposa, não só contrasta com a história dos Estados Unidos da América, de respeito à lei e aos direitos fundamentais, como também violenta o Direito Internacional, a soberania do Brasil e a independência do Judiciário.”
Moraes disse que “a independência do Judiciário, coragem institucional e defesa à soberania nacional fazem parte do universo republicano dos juízes brasileiros, que não aceitarão coações ou obstruções no exercício de sua missão constitucional conferida soberanamente pelo Povo brasileiro.”
Por fim, afirmou que “como integrante do Supremo Tribunal Federal, continuará a cumprir sua missão constitucional de julgar com independência e imparcialidade.”
Alvo de suspensão de visto por parte dos Estados Unidos, o advogado-geral da União, Jorge Messias, disse que “as mais recentes medidas aplicadas pelo governo dos EUA contra autoridades brasileiras e familiares, agrava um desarrazoado conjunto de ações unilaterais, totalmente incompatíveis com a pacífica e harmoniosa condução de relações entre os dois países.”
Messias disse que “diante desta agressão injusta, reafirma o integral compromisso com a independência constitucional do nosso Sistema de Justiça e que recebe sem receios a medida especificamente contra ele dirigida.”
Os outros alvos das sanções americanas anunciadas nesta segunda-feira não se manifestaram.