Governo Lula vê big techs como ponto central de negociação com Trump e já faz sinalizações


Governo brasileiro adota cautela sobre conversa entre Trump e Lula
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva avalia que os interesses das big techs vão estar no centro de uma provável mesa de negociação comercial com a gestão de Donald Trump, após o mandatário americano ter demonstrado abertura ao diálogo.
Diante desta perspectiva, o Palácio do Planalto já fez algumas sinalizações, como a apresentação, na semana passada, da Medida Provisória que estimula a instalação dos datacenters no Brasil, batizada de Redata.
📱Baixe o app do g1 para ver notícias em tempo real e de graça
O governo também está disposto a discutir outros tópicos caros às plataformas, como os projetos que tratam da regulação econômica dos mercados digitais e da taxação dos serviços de streamings, além da Resolução 780 da Anatel, publicada no mês passado.
Cautela
A expectativa é que Lula e Trump conversem na semana que vem. O cenário mais provável é que seja um diálogo por videoconferência ou por telefone. O Itamaraty trata os preparativos com muita cautela para se resguardar de que não haverá qualquer tentativa de Trump de tirar proveito do encontro para causar constrangimento a Lula.
Via de regra, a conversa entre chefes de estado nestas circunstâncias não permite um aprofundamento da negociação comercial e tem um caráter mais simbólico, embora fundamental. As tratativas comerciais são feitas em nível técnico – entre diplomatas de várias áreas – e ministerial.
A expectativa no governo brasileiro é que o possível encontro entre Lula e Trump estabeleça uma mesa de negociação concreta, o que até agora não ocorreu. Como o governo brasileiro já deixou claro que a situação jurídica de Jair Bolsonaro não será discutida em hipótese alguma, o foco recai sobre os interesses das big techs, que gozam de grande influência junto à Casa Branca e ao Departamento de Estado.
Outro tópico que mobiliza o governo Trump é o acesso às terras raras e minerais críticos. Lula já afirmou que os minerais são propriedade do povo brasileiro, mas também já fez sinalizações de que a exploração desses recursos pode ser discutida com empresas estrangeiras.
Veja abaixo alguns dos temas que podem ser discutidos com a Casa Branca e que dizem respeito às big techs
Lula durante discurso de Trump na ONU
Brendan SMIALOWSKI/AFP e Evan Vucci/AP
1) Regulação econômica das plataformas
Na semana passada, o governo Lula encaminhou ao Congresso o projeto de regulação econômica das plataformas digitais. Em síntese, a proposta cria instrumentos para que o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) coiba várias práticas anti-concorrenciais pelas big techs e dilua a concentração no setor.
Entre essas medidas estão a venda casada de produtos, falta de transparência dos buscadores, taxas abusivas praticadas por lojas de aplicativos, entre outras. A proposta tem como foco as gigantes do Vale do Silício, em especial as chamadas “big five”: Amazon, Apple, Alphabet (Google), Meta e Microsoft.
Na visão do governo, o tema incomoda as plataformas mais poderosas e com maior interlocução junto à Casa Branca.
LEIA TAMBÉM: ‘Imperador do mundo’ e ‘desapontado com o Brasil’: antes de ‘amizade’, o que Lula e Trump já falaram um do outro
2) MP dos datacenters
No mesmo dia de apresentação do projeto de regulação econômica, o governo publicou a MP do Redata, que agrada o setor por estimular a instalação de datacenters no Brasil, equipamentos usados para armazenar e processar os dados das plataformas. O Brasil é estratégico na instalação de datacenters por dispor de energia limpa, barata e abundante para alimentar os equipamentos.
Segundo fontes do governo, o Planalto apresentou conjuntamente as duas medidas de forma proposital, como estratégia de negociação com as big techs, mas também de olho em uma possível tratativa com Washington.
3) Taxação dos streamings
Outro projeto que desperta o interesse das plataformas é que trata da taxação dos serviços de streaming (PL 8.889/2017). O texto prevê que as plataformas estrangeiras contribuam com uma alíquota de 6% sobre a receita bruta.
Em agosto, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu manter a constitucionalidade da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) sobre remessas ao exterior, sem restringir sua incidência apenas às operações diretamente ligadas à importação de tecnologia
O temor das big techs é que a taxação se estenda a outros serviços digitais, como buscadores e agregadores que não pagam direitos autorais a quem de fato produziu o conteúdo.
O relator da matéria na Câmara é o deputado federal Dr. Luizinho (PP-RJ). A expectativa é que o texto seja votado ainda em 2026.
4) Resolução da 780 Anatel
Por fim, outra medida que contraria interesses das plataformas é a Resolução 780 da Anatel, publicada em agosto deste ano. A medida determina que as empresas que comercializam produtos digitalmente, os chamados marketplaces, passem a responder solidariamente, junto com os vendedores, por infrações relacionadas à oferta de produtos irregulares.
Segundo fontes do governo, as plataformas já se manifestaram pela derrubada ou pela alteração da resolução.
Big techs ou Bolsonaro?
Integrantes do governo Lula, incluindo o próprio presidente, sempre externaram que o tarifaço tem motivação político-eleitoral. Veem nas sanções aplicadas ao Brasil uma estratégia para constranger o judiciário brasileiro e fragilizar o governo Lula, criando condições para que a direita volte a governar o país.
Para o governo brasileiro, Trump quer no Brasil um regime subserviente aos Estados Unidos, uma espécie de satélite americano no Sul Global para servir a Washington na disputa pela hegemonia global com a China.
Por outro lado, sempre houve uma percepção dentro do governo Lula de que a defesa dos interesses das big techs também é uma peça fundamental por trás do tarifaço e das sanções. Uma ala do governo, inclusive, entende que esse ponto é mais importante do que a situação jurídica de Bolsonaro.

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *