Câmera da PM registra ação que deixou cinco mortos durante Operação Verão em SP
O Conselho Especial de Justiça absolveu dois policiais militares denunciados por prática de fraude processual, na qual teriam supostamente implantado duas armas junto aos suspeitos mortos durante uma ação em São Vicente, no litoral de São Paulo. Cabe recurso da decisão.
O caso ocorreu no bairro Jardim Rio Branco, durante a Operação Verão, em fevereiro de 2024. Um boletim de ocorrência registrado à época pontuou que policiais foram alvos de tiros enquanto estavam em ação contra o tráfico de drogas e reagiram, atingindo os suspeitos. Nas imagens, obtidas pelo g1, é possível ouvir que um dos suspeitos disse estar desarmado. “Não tem arma, senhor” (assista acima).
No julgamento realizado no último dia 23, o Conselho Especial de Justiça absolveu, por unanimidade, o capitão Gabriel Marinho Gonçalves Pereira e o cabo Jander de Oliveira Araújo por falta de provas suficientes para a condenação.
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PMs foram absolvidos após denúncia de fraude processual durante ação em São Vicente (SP)
Ministério Público de São Paulo
A denúncia do Ministério Público de São Paulo (MP-SP) trouxe uma análise das imagens captadas pelas câmeras corporais dos PMs. Segundo o órgão, o vídeo mostra Jander mexendo nas roupas de um dos baleados enquanto Marinho segurava um fuzil ao fundo. Nesse momento, ainda de acordo com o documento, “não se vê nenhuma arma de fogo com os civis ou próximo a eles”.
Em seguida, segundo o MP-SP, os denunciados “decidiram alterar a cena do crime e simular uma situação de confronto”. As imagens da câmera corporal do cabo Jander, de acordo com o documento, deixaram clara a fraude dos PMs.
Advogados dos denunciados
Por meio de nota, a defesa dos policiais militares afirmou que, no decorrer do processo, demonstrou que as “armas utilizadas pelos agressores da sociedade já estavam de posse dos indivíduos no confronto bélico, ou seja, antes mesmo da chegada de qualquer outra equipe policial ao local”.
Segundo a defesa, também foi demonstrado que os PMs Marinho e Jander “não teriam qualquer condição de ter inovado [alterado]o local em que foram agredidos e provocados a revidar a injusta agressão”.
Por fim, a defesa alegou que, diante desse quadro, o Conselho Permanente de Justiça, composto por Juízes Militares, além do juiz togado, entendeu de forma unânime não ter havido qualquer prova que demonstrasse ato ilícito por parte dos agentes.
A nota foi assinada pelos advogados Alex Sandro Ochsendorf, Luiz Nakaharada, Gabriel Cabrera Affonso, Bianca Campos Ferreira e Jurandir Georgino Ventura.
PMs foram absolvidos após denúncia de fraude processual durante ação em São Vicente (SP)
Ministério Público de São Paulo
Análise
A pedido do g1, os advogados Thyago Garcia e Victor Teixeira, que não têm relação com o caso, explicaram que a decisão judicial ainda pode ser objeto de recurso por parte do Ministério Público, conforme prevê o Código de Processo Penal Militar.
“Apenas após o trânsito em julgado é que a absolvição se torna definitiva e irreversível”, comentou Teixeira.
Garcia, por sua vez, pontuou que na denúncia que originou o processo a imputação era unicamente o crime de fraude processual (artigo 347, parágrafo único, do Código Penal). Segundo ele, caso houvesse condenação, a pena poderia variar de seis meses a quatro anos de detenção, além de multa.
Relembre o caso
Câmeras corporais da Polícia Militar mostram a ação que deixou cinco suspeitos mortos em São Vicente, durante a Operação Verão, em fevereiro de 2024.
No BO, quatro vítimas fatais foram identificadas como Peterson Souza Da Silva Xavier Nogueira (32 anos), Luiz Henrique Jurovitz Alves De Lima (18 anos), Kauê Henrique Diniz Batista (17 anos) e Marcus Vinícius Jurovitz De Lima (17 anos). Além delas, um jovem de 24 anos, morreu dias depois, após ser internado em um hospital na cidade.
No vídeo, divulgado primeiro pelo UOL, é possível ver policiais correndo em uma área de mata por volta das 19h do dia 27 de fevereiro de 2024. “Larga, larga, larga! Se liga, malandro. Larga a arma, c*”, gritaram os agentes.
Como resposta, um dos homens afirmou que estava desarmado: “Sem arma, senhor! Não tem arma, senhor! Não tem arma, senhor! Pelo amor de Deus, senhor!”. Apesar disso, ainda é possível ouvir novos disparos efetuados pelos agentes.
O g1 noticiou, no início de julho, que o procurador-geral de Justiça do Estado de São Paulo, Paulo Sérgio de Oliveira e Castro, manteve arquivados 11 inquéritos que investigavam a conduta de policiais militares durante as operações Escudo e Verão, que deixaram um saldo oficial de 84 mortos pela PM na Baixada Santista (veja adiante).
Ação da PM deixou cinco suspeitos mortos no bairro Jardim Rio Branco, em São Vicente (SP)
Reprodução
Versão dos moradores
Segundo a população, um dia antes da operação, policiais militares estiveram no local procurando por um drone que teria desaparecido após apresentar um problema e fazer um pouso na área. Na ocasião, os agentes teriam feito ameaças de que retornariam ao local para uma operação.
“Eu estava aqui e vi tudo. Eles chegaram, umas cinco viaturas da Baep [Batalhão de Ações Especiais de Polícia] e simplesmente chegaram já atirando”, disse uma moradora do bairro em entrevista ao repórter Walace Lara, da TV Globo. A mulher teve a identidade preservada.
Chinelos e cápsulas de fuzil foram encontradas no Jardim Rio Branco, em São Vicente (SP)
Marco Antonio Gonçalves/TV Globo
Um outro morador deu a mesma versão. Ele contou que não existiu troca de tiros e lembrou os sons dos disparos. “Não foi um estampido aberto. Foi tiro de fuzil mesmo”, disse ao repórter da Globo.
“Era muito tá, tá, tá, tá… muito. Eu achei que tava desmoronando alguma casa, era um barulho muito alto”, complementou a moradora.
No dia seguinte aos disparos, a equipe de reportagem da TV Globo ainda encontrou no local pares de chinelos e ao menos 15 cápsulas de fuzis no chão.
Segundo apurado pelo repórter da TV Globo, cápsulas de outros tipos de arma não foram localizadas. Uma das testemunhas informou que a área não foi periciada.
Testemunhas negam confronto entre PM e suspeitos em operação com 4 mortos
Versão do BO
De acordo com o boletim de ocorrência (BO), obtido pelo g1, uma equipe policial realizava operação de combate ao tráfico de drogas na região e resolveu surpreender traficantes chegando a um ponto de venda por uma área de mata e mangue.
Como o local era de difícil acesso, os policiais solicitaram apoio de outras equipes, que foram em direção ao mesmo destino, mas pela rota normal. Segundo o BO, os traficantes se depararam com esses agentes e, por isso, tentaram fugir pela área de mata. Eles foram surpreendidos pela equipe que fazia a operação e passaram a disparar contra os policiais, que revidaram.
Caso aconteceu em região de mata do bairro Jardim Rio Branco, em São Vicente (SP)
Marco Antonio Gonçalves/TV Globo
Após o tiroteio, os agentes resgataram cinco homens que estavam caídos no chão baleados e acionaram o socorro. Eles foram encaminhados para hospitais da cidade, mas quatro não resistiram. Dias depois, ocorreu a morte do quinto suspeito.
Ainda segundo o registro policial, foram encontradas três armas de fogo (dois revólveres calibre 38 e uma pistola calibre 40) e um carregador ao lado dos homens baleados.
Já no ponto de venda de drogas, foram localizadas 68 porções de maconha, 55 pedras de substância aparentando ser crack e 77 porções de cocaína, separadas e embaladas para venda, além da quantia de R$ 729 em espécie e cinco aparelhos celulares.
A Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP) afirmou à época que a informação de que a PM teria perdido um drone na região era improcedente. A pasta ainda enfatizou que o grupo que foi morto estava com drogas e armas, que foram apreendidas.
Caso aconteceu no bairro Jardim Rio Branco, em São Vicente
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