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A arrecadação do Imposto Sobre Operações Financeiras (IOF) bateu recorde e atingiu o maior valor da história para o período de um mês em agosto. O aumento ocorre após a batalha judicial que terminou com o aumento do imposto em diversas operações.
O valor é recorde para todos os meses, segundo números da Secretaria da Receita Federal. A série histórica do órgão começa em 1995.
🔎O IOF é um imposto que o governo cobra sobre algumas transações financeiras que as pessoas e empresas fazem no dia a dia, como pegar um empréstimo, comprar moeda estrangeira ou fazer certos tipos de investimentos em seguros. O valor da alíquota varia de acordo com a operação.
👉🏽 Segundo a Receita, a arrecadação do IOF somou R$ 8,45 bilhões no mês retrasado, com impressionante crescimento de 42,5% na comparação com agosto de 2024. Com os valores corrigidos pela inflação, a alta também foi expressiva: de 35,6%.
A equipe econômica anunciou o aumento do IOF no fim de maio como estratégia para tentar atingir as metas fiscais deste ano e, também, de 2026 – diante da necessidade de atingir os objetivos fixados em lei (déficit zero em 2025 e superávit no próximo ano, com intervalo de tolerância). Entre idas e vindas, a alta foi confirmada em julho (veja mais abaixo nessa reportagem).
Questionada pelo g1, a Receita Federal não soube dimensionar quanto do aumento da arrecadação do IOF, em agosto, está relacionada com a alta de tributos e quanto está vinculado ao comportamento da economia.
“Não é possível fazer esta segregação”, informou o órgão.
Mas é fato que a arrecadação recorde do IOF acontece em um momento de desaceleração da economia, fruto da taxa básica de juros no maior nível em quase 20 anos, algo que já tem freado as receitas do governo.
E, também, em um momento de queda das concessões de empréstimos – que se retraíram 0,2% em agosto, segundo informações divulgadas pelo Banco Central.
Aumentos do IOF confirmados
▶️Compras internacionais com cartão de crédito e débito: alíquota do IOF sobe de 3,38% para 3,5%.
▶️Compra de moeda em espécie e remessas ao exterior: passa de 1,1% para 3,5%.
▶️Empréstimos a empresas: alíquota diária de IOF dobra, de 0,0041% para 0,0082%.
▶️Seguros VGBL (voltados às pessoas de alta renda): de 0% para 5% de IOF.
▶️Fundos de investimento em direitos creditórios (FIDCs): passam a ter cobrança de 0,38%.
Mercado financeiro criticou aumento
➡️O anúncio de aumento do IOF, em maio deste ano, gerou repercussão negativa nos agentes do mercado financeiro, que criticaram o foco do governo em novos aumentos de tributos — deixando em segundo plano cortes de gastos.
Carlos Braga Monteiro, CEO do Grupo Studio, avaliou, naquele momento, que governo busca arrecadar recursos com o aumento do IOF sem mexer nos fundamentos da economia.
“Aumentar o IOF significa elevar custos operacionais, especialmente para empresas que dependem de crédito rotativo e financiamento. Em vez disso, deveríamos estar discutindo como reduzir custos estruturais do Estado, incentivar eficiência na gestão pública e promover compliance fiscal como mecanismo de equilíbrio entre arrecadação e competitividade empresarial”, disse.
Theo Braga, CEO da SME The New Economy, por sua vez, apontou que o aumento de imposto é um desincentivo direto à inovação e ao crescimento empresarial.
“O empreendedor brasileiro já lida com uma carga tributária pesada e uma série de incertezas. O IOF mais alto desestimula operações de crédito e investimento, justamente em um momento em que o país precisa impulsionar a nova economia. O foco deveria estar em simplificar, digitalizar e desburocratizar, não em criar novos custos”, afirmou.
Veja no JG: Mercado financeiro reage mal ao aumento do IOF
Briga com o Congresso Nacional
➡️A proposta também enfrentou forte rejeição no Legislativo, mesmo com o governo tendo recuado parcialmente em alguns pontos.
Parlamentares apontaram descontentamento com aumentos de tributos e com a demora na liberação de emendas parlamentares, além de terem feito críticas à condução da política econômica pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
Diante das discordâncias, o Congresso Nacional derrubou o aumento do tributo no fim de junho. A última vez que o Legislativo tinha rejeitado um decreto presidencial havia sido em 1992, na gestão Fernando Collor.
Congresso derruba alta do IOF
O governo não aceitou a derrota e, no início de julho, recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) para restabelecer o aumento do IOF. O argumento foi de que a Constituição Federal conferiu ao presidente da República a prerrogativa de alterar o tributo.
Em meados de julho, o ministro Alexandre de Moraes, do STF, retomou, em parte, decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva que elevou a cobrança do IOF, atendendo quase todo o pedido da equipe econômica.
Moraes mantém quase totalidade do decreto do governo de aumento do IOF
➡️Com a derrubada momentânea do aumento do IOF, a equipe econômica alegou que precisava compensar a perda de recursos e propôs uma Medida Provisória elevando uma série de tributos, como sobre: bets, fintechs, LCIs e LCAs, juros sobre capital próprio e limitação de compensações.
➡️Mesmo com o retorno parcial da alta do IOF, as medidas de aumento de arrecadação foram mantidas e estão nas previsões do orçamento para tentar fechar as contas em 2026. Elas sofrem, porém, forte resistência do setor produtivo. O governo anunciou que negocia ajustes com o Legislativo, e a votação está prevista para ter início nesta semana.
Mercado depois da alta do IOF
Além de contribuir para frear mais o crédito bancário, com impacto na economia real, analistas apontam que o aumento do IOF também mudou a dinâmica do mercado ao passar a tributar os FIDCs.
Para Walter Fritzke, Head de Mercado de Capitais no Martinelli Advogados, a arrecadação recorde do IOF em agosto é um dado fiscal, mas também um sinal regulatório que expõe a necessidade de empresas e investidores repensarem o uso de instrumentos de crédito e de mercado de capitais.
“Diante deste cenário de crescimento do IOF, a tendência é que fundos e estruturas de securitização se tornem ainda mais relevantes como alternativa ao crédito bancário tradicional, já que não sofrem incidência do imposto por não se enquadrarem em operação de crédito, mas como cessão de recebíveis”, avaliou Walter Fritzke, do Martinelli Advogados.
De acordo com ele, a agenda de empresas e investidores passou a incluir não apenas custo financeiro, mas também uma arquitetura jurídica e tributária conjunta, para que a busca por liquidez não resulte em carga fiscal desproporcional.