O vape está trazendo o cigarro de volta?
Práticos e aparentemente “descolados”, os cigarros eletrônicos ganharam grande visibilidade nos últimos 15 anos. Mesmo após décadas de queda no tabagismo entre adolescentes, o famoso vape conquistou popularidade justamente entre os mais jovens.
O dispositivo já afetou até mesmo nomes conhecidos do público. A cantora Solange Almeida, ex-Aviões do Forró, e a influenciadora Vanessa Lopes, ex-participante do Big Brother Brasil, já relataram problemas graves nas cordas vocais relacionados ao uso do eletrônico — em ambos os casos, houve risco de perda da voz.
Cerca de 27 milhões de brasileiros com 14 anos ou mais fumam cigarro convencional ou eletrônico. Apesar da aparência inofensiva, os vapes concentram até três vezes mais nicotina que o cigarro comum e ainda liberam metais pesados e químicos associados a câncer, ansiedade e depressão. Desde 2009, a Anvisa proíbe a comercialização do produto no Brasil.
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Quarta (e atual) geração do cigarro eletrônico, também conhecido como vape.
Reprodução/Profissão Repórter
Além dos danos sistêmicos, as cordas vocais também sofrem. Médicos relatam aumento de casos de inflamações na laringe em usuários frequentes de vape, muitas vezes com perda temporária da voz. Para artistas que dependem da fala e do canto, como Solange Almeida, os efeitos foram sentidos de forma ainda mais dramática.
Tragadas em excesso e riscos invisíveis
A quantidade de tragadas necessárias para atingir os altos níveis de nicotina é um dos fatores preocupantes e responsáveis por acelerar os processos inflamatórios nas vias respiratórias. Enquanto um fumante de cigarro comum consome em média 200 tragadas por maço, usuários de vape podem chegar a 1.000 ou até 3.000 por dia.
O aerossol gerado pelo dispositivo contém não apenas nicotina, mas também aromatizantes, propilenoglicol e substâncias que, ao serem aquecidas a cerca de 250 °C, se transformam em partículas ultrafinas.
A doutora Jaqueline Scholz diretora do Programa de Tratamento do Tabagismo do Incor, explica que a nova geração de vape tem seu conteúdo formado por sais de nicotina e ácido, o que o torna mais perigoso.
“São micropartículas que alcançam os alvéolos pulmonares e caem diretamente na corrente sanguínea, provocando inflamações em todo o organismo. Há relatos de casos de pneumonites, crises respiratórias graves, problemas cardiovasculares e até infartos em jovens.
Por isso, muitos jovens, em poucos meses de uso, já apresentam problemas graves que demorariam décadas para surgir em fumantes tradicionais. Além disso, a influência de amigos e familiares é apontada como a principal porta de entrada para o consumo, o que torna essencial o debate sobre consciência, responsabilidade e prevenção.
Em resumo, “o vape não acrescenta nada de positivo à vida do usuário: traz dependência intensa, prejuízos rápidos e sérios à saúde respiratória, cardiovascular e vocal, além de aumentar a vulnerabilidade de jovens que muitas vezes nunca tiveram contato com o cigarro convencional”, afirmou Jaqueline.
Dependência rápida e intensa
Uma pesquisa realizada pelo Instituto do Coração (Incor), em parceria com a Vigilância Sanitária e o Laboratório de Toxicologia da FMUSP, analisou mais de 400 usuários de cigarro eletrônico. Os resultados mostraram que os níveis de nicotina nesses indivíduos podem ser até seis vezes superiores aos encontrados em fumantes de cigarro convencional.
Segundo a Doutora Jaqueline Scholz que também coordenou o estudo, a percepção dos próprios usuários coincide com os achados laboratoriais: quem se sente mais dependente, de fato, apresenta taxas mais altas da substância no organismo.
O tempo para que a dependência se instale também chama atenção. Enquanto no cigarro tradicional isso costuma levar anos, no eletrônico muitos jovens já relatam quadro intenso em apenas três a seis meses de uso. Cerca de 70% dos entrevistados tinham entre 18 e 25 anos e nunca haviam fumado antes de experimentar o vape.
“Tecnologia aperfeiçoada para o mal”
Apesar da propaganda do vape passar uma imagem de produto moderno e menos prejudicial, na prática ele intensifica a dependência e antecipa os danos. Doenças que no cigarro tradicional levariam décadas para se manifestar, no eletrônico aparecem em poucos meses.
Para a doutora Jaqueline Scholz, os números não deixam dúvidas.
“Os níveis de nicotina nos usuários de cigarro eletrônico podem ser extremamente elevados, muitas vezes superiores aos de usuários do cigarro convencional, quando o consumo do produto é diário e intenso. A nicotina é uma substância tóxica com efeito danoso ao sistema cardiovascular e responsável pela dependência química.”
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