Após polêmica, consórcio começa a retirar esferas de concreto da área central de Brasília
O consórcio privado que administra a Rodoviária do Plano Piloto, em Brasília, retirou nesta terça-feira (9) as esferas de concreto que tinham sido instaladas nas vias de pedestres da região.
As estruturas apareceram no espaço há cerca de três meses, conforme a concessionária Capital assumiu a gestão da rodoviária, do Conic, da Galeria dos Estados e do Setor Comercial Sul.
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Segundo o consórcio, a ideia era dar mais segurança aos estacionamentos – e evitar que carros saíssem sem pagar atravessando o meio-fio, por exemplo. A instalação, no entanto, não foi sequer informada ao Iphan, órgão responsável por fiscalizar o respeito ao tombamento da cidade.
As esferas não são inéditas – parte das estruturas já tinha sido instalada pela antiga gestão. A multiplicação de “bolas”, no entanto, passou a prejudicar ainda mais a mobilidade e a acessibilidade de quem precisa andar pela região todos os dias.
Questionado, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) disse que não tinha sido consultado sobre a instalação, e que a questão estava sendo debatida em um grupo técnico.
Nesta terça, após a retirada, o presidente do Iphan, Leandro Grass, afirmou à TV Globo que fica “satisfeito que o bom senso tenha prevalecido”.
“Esperamos que o consórcio observe a legislação e os ritos administrativos quando cogitar qualquer intervenção no conjunto urbanístico da cidade”, escreveu Grass.
Esferas de concreto na plataforma superior da Rodoviária do Plano Piloto, em Brasília
Luiza de Paula/g1
A justificativa para a retirada
Em notas divulgadas nesta terça, a Secretaria de Mobilidade do DF e o consórcio Catedral afirmaram que a retirada foi feita no domingo (7), em comum acordo.
“A Secretaria de Transporte e Mobilidade informa que a pasta avaliou, em conjunto com o Consórcio Catedral, a retirada das esferas de concreto para que seja utilizado um tipo de dispositivo tecnológico, não agressivo, para inibir a evasão de receitas com estacionamento”, disse o governo.
Já o consórcio ressalvou que as esferas eram “semelhantes” às existentes no entorno do Mané Garrincha e do Centro de Convenções – e que não estavam em locais destinados à circulação de pedestres.
“A segurança e a acessibilidade dos usuários, especialmente das pessoas com necessidades especiais, continuam sendo prioridades para a Concessionária Catedral”, diz a empresa.
Esferas de concreto atrapalham pedestres e complicam mobilidade na área central do DF
Mobilidade prejudicada
O g1 foi à Rodoviária do Plano Piloto e ao Setor Comercial Sul durante a tarde da última sexta-feira (5) para conferir a situação das instalações e ouvir quem usa a região todos os dias.
Nos dois locais, entrevistados apontaram a redução do espaço para os pedestres e a má alocação das esferas.
O servidor público Marcos Carvalho, de 32 anos, morador de Samambaia afirma que frequenta constantemente a região do Plano Piloto e que já havia observado a adição das barreiras, ele contesta o porquê da escolha dessas bolas de concreto.
“Se o pedestre já tem dificuldade, eu fico imaginando uma pessoa com mobilidade reduzida […] Com certeza atrapalha.” diz o servidor.
Esferas de concreto na área central do Distrito Federal
Luiza de Paula/g1
Além da questão da mobilidade outros fatores também foram observados pelos pedestres, como o valor estético e a relação com o projeto arquitetônico e urbanístico que Lúcio Costa idealizou. O estudante Silvio Soares, de 50 anos, morador da Asa Sul, aponta que não gostou da composição.
“Esteticamente falando, isso é feio, é horrível e também atrapalha a mobilidade”. diz estudante.
Para que servem?
A Seduh afirma que as esferas existentes no Setor Comercial Sul, na altura da W3, estão no local há anos e não fazem parte da atual intervenção.
Já na Rodoviária do Plano Piloto, a implementação fez parte do cronograma de melhorias da Concessionária Catedral, responsável pela gestão atual do espaço.
Segundo a concessionária, as esferas fazem parte do “mobiliário urbano” e seguem modelos já implantados em outras partes da cidade. A empresa também afirma que as esferas não tinham caráter permanente e não foram posicionados em locais destinados à circulação de pedestres.
“Elas são instaladas com o objetivo de coibir manobras proibidas por partes de veículos e organizar o fluxo de pedestres, direcionando-os para locais corretos de passagem e evitando situações de risco. Por isso, são posicionadas apenas em áreas que não são destinadas à circulação de pedestres”, afirmou a concessionária dias antes da retirada.
Brasília é patrimônio mundial
O professor Benny Schvarsberg explica que Brasília é tombada graças ao seu conjunto urbanístico-arquitetônico, feito a partir do projeto de Lucio Costa para a construção da capital, apresentado em 1957.
O planejamento foi inscrito no Livro de Tombo Histórico pelo Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Em 1987, a Unesco reconheceu o conjunto urbano como Patrimônio Mundial.
“É uma cidade única, representa o ideal urbanista modernista. É a maior cidade moderna tombada”, diz Benny Schvarsberg.
Brasília tem tombamento urbanístico, ou seja, edifícios podem ser construídos, modificados, mas respeitando a proposta de Lucio Costa. Benny Schvarsberg explica que há quatro escalas de tomabamento da capital:
Residencial, com a organização das superquadras;
Monumental, que envolve as construções no eixo monumental;
Gregárias, que trata dos locais onde as pessoas “se agregam”, como as áreas comerciais;
Bucólica, que representa as áreas verdes.
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