Corte Interamericana julga Brasil por mortes de recém-nascidos em UTI de Cabo Frio nos anos 90


Corte Interamericana julga Brasil por mortes de recém-nascidos
A Corte Interamericana de Direitos Humanos realiza nesta sexta-feira (26), em Assunção, no Paraguai, a audiência de julgamento do caso “Mães de Cabo Frio vs. Brasil”, que apura violações relacionadas à morte de ao menos 96 bebês na UTI neonatal da Clínica Pediátrica da Região dos Lagos (Clipel), em Cabo Frio (RJ), entre junho de 1996 e março de 1997.
A sessão está prevista para começar às 8h30 (horário de Brasília e local).
O caso foi revelado pelo jornal O Globo em 1997, após denúncias de familiares ao Ministério Público do Rio de Janeiro. Segundo a ONG Justiça Global, que representa as famílias desde 2024, trata-se do 1º julgamento internacional em que o Brasil responde por violações sistemáticas ao direito à saúde de recém-nascidos e de seus familiares.
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Quase 100 bebês morreram em UTI neonatal de Cabo Frio
Reprodução/TV Globo
O que está em jogo
De acordo com a Justiça Global, os bebês foram vítimas de infecções hospitalares decorrentes de práticas incompatíveis com padrões básicos de vigilância sanitária. A entidade afirma que houve omissão do Estado na prevenção, fiscalização, investigação, responsabilização e reparação às famílias.
Se condenado, o Brasil terá de cumprir a decisão internacional, o que pode incluir pagamento de indenizações, assistência psicológica às famílias, reabertura de investigações e adoção de medidas para evitar novas mortes em UTIs neonatais.
O próprio Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania afirma que sentenças da Corte têm “impacto direto na política interna brasileira”.
“Ao fortalecer políticas de vigilância infectológica e sanitária, além do cuidado com mães e recém-nascidos, esperamos que este caso também fortaleça o SUS como patrimônio do povo brasileiro”, disse a diretora-executiva da Justiça Global, Glaucia Marinho.
Depoimentos e expectativa de julgamento
Segundo “O Globo”, parte dos depoimentos das famílias será entregue por escrito, e os parentes irão vestidos de branco para a audiência.
A advogada Daniela Fichino, que representa as mães, afirmou ao jornal que o processo evidencia falhas de fiscalização em prestadores de serviços privados conveniados ao SUS.
O jornal também informou que a Corte deverá reconhecer a responsabilidade internacional do Brasil e impor medidas de reparação.
Histórico do caso
A denúncia foi apresentada ao Sistema Interamericano em 2000. Em 2008, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) admitiu o caso e, em 2022, emitiu relatório de mérito concluindo que o Brasil violou direitos à vida, à saúde, à proteção judicial, à infância e à igualdade. Em março de 2024, a CIDH submeteu o processo à Corte IDH.
No âmbito interno, investigações resultaram no indiciamento do diretor da clínica em 1998 e de mais oito médicos em 1999. Em 2003, todos foram absolvidos por falta de nexo causal comprovado — não foi possível provar que a conduta dos médicos ou do diretor da clínica foi a causa direta das mortes dos bebês; a decisão foi mantida em 2005 e confirmada em 2007.
O que dizem os envolvidos
Em nota ao “Globo”, a Clipel afirmou que o pedido de condenação do Estado brasileiro não diz respeito aos sócios da clínica e negou negligência, destacando que os médicos foram absolvidos na Justiça estadual.
O Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania disse que, em caso de condenação, o Brasil terá obrigação de cumprir a decisão da Corte, com articulação entre órgãos do governo para garantir a reparação.
Possíveis reparações
A Justiça Global pede o reconhecimento da responsabilidade do Estado e reparação integral às famílias, com indenizações, medidas de reabilitação e garantias de não repetição. Entre as propostas estão a construção de um memorial em Cabo Frio, protocolos mais rígidos de vigilância sanitária e avanços nas políticas de saúde materna e neonatal.

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