Cozinheira que ficou em coma após AVC aos 26 anos usa culinária para reaprender movimentos: ‘Muito mais viva’


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A cozinha sempre foi o lugar onde Luara Rangel Contessoto, de 26 anos, se sentia viva. Entre panelas, temperos e chamas, ela construía sua carreira como cozinheira desde os 18 anos. Porém, em novembro de 2024, perdeu a rotina que amava: Luara sofreu um Acidente Vascular Cerebral (AVC) que a deixou 38 dias internada – 10 dias em coma.
“Eu achei que ia ficar perdida, achei que ninguém podia me ajudar. Achei que eu ia ficar… Sei lá, [em estado] vegetativo”, conta a jovem, que ficou internada em um hospital particular de Campinas.
Quase um ano depois do AVC, a cozinheira passa por um tratamento multidisciplinar no Serviço de Reabilitação Lucy Montoro, em Mogi Mirim (SP), pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Lá, ela tem reaprendido movimentos e pôde voltar a cozinhar, com a ajuda de ferramentas adaptadas e de uma equipe multidisciplinar. Veja no vídeo acima.
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“A cozinha é a minha vida. Se eu não conseguisse cozinhar mais, eu acho que não conseguiria viver. E agora que eu estou conseguindo, pelo menos um pouco, eu estou me sentindo muito mais viva. Se eu não conseguisse cozinhar, eu não ia ser feliz”, afirma Luara.
No Dia Mundial do Combate ao AVC, conheça a história da jovem que, através do ato de cozinhar, encontra força e esperança para sua recuperação.
Adaptação e superação
Luara Rangel Contessoto, de 26 anos, reaprende a cozinhar durante processo de reabilitação após AVC.
Estevão Mamédio/g1
Ainda internada no hospital, Luara passou por uma rotina intensa de fisioterapia. Após a alta, teve que se mudar para Mogi Guaçu (SP) para morar com a mãe, sua principal rede de apoio.
Em fevereiro deste ano, ela conseguiu o encaminhamento para ser atendida na unidade da rede Lucy Montoro de Mogi Mirim e, aos poucos, recupera seus movimentos.
Luara era destra, mas perdeu os movimentos do braço direito. Com o suporte de uma equipe multidisciplinar — formada por profissionais como fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais e psicólogos — e o uso de ferramentas adaptadas, ela vem recuperando movimentos e aprendendo a realizar tarefas com a mão esquerda.
“Eu consigo ler e escrever já com a mão esquerda. Eu desenho com a mão esquerda, muito bem, inclusive. Quando cozinhava, eu salteava com as duas mãos, tinha um pouco de prática com isso. Mas desenhar, pintar… eu não achei que ia ficar tão bom assim”, comemora.
No centro de reabilitação, a jovem é atendida em um espaço equipado para simular atividades básicas e rotineiras, com cozinha, uma lavanderia simples, cama, além de mesas e cadeiras. Lá, ela pôde treinar os movimentos necessários para voltar a cozinhar seus pratos preferidos.
A primeira receita? Um nhoque, com a massa feita por ela. “Eu chorei horrores, chorei muito. Eu fiquei muito feliz porque eu consegui”, celebra.
Prato especial durante entrevista
Luara preparou uma receita de massa fresca com molho oriental para a equipe do g1.
Estevão Mamédio/g1
Durante a gravação desta reportagem, Luara preparou uma receita de massa fresca com molho oriental especialmente para a equipe do g1.
Para o preparo, ela usou equipamentos como talheres com o cabo mais grosso, mais fáceis de segurar, e uma tábua de corte com pregos, para que os alimentos não escorreguem.
A tia, que também é cozinheira, cortou os ingredientes que Luara ainda não consegue sozinha, como a cebola. “Eu cortava muito bem, e agora estou aprendendo a cortar de novo. Mas eu estou conseguindo, está indo bem até”, comenta a jovem.
‘A cozinha é um lar’
Para Luara, cozinhar é mais que uma profissão. “Quando você fala, está gostosa a comida, para mim é ótimo. Eu gostava do ambiente da cozinha, a correria, o fogo. Eu sou apaixonada por flambar”, relembra.
Ela sabe que talvez não volte à rotina intensa de uma cozinha profissional, mas já planeja novos caminhos.
“Eu quero fazer alguma coisa pra vender, e eu quero dar aula na cozinha. Eu sempre gostei de ensinar. Sempre ensinei as pessoas que trabalhavam na cozinha comigo, e aprendi muito também. A cozinha para mim é um lar”, conta, esperançosa.
Luara usa a própria experiência para encorajar que outras pessoas não percam a esperança durante a reabilitação.
“Não desiste, que você vai conseguir sim. Todo mundo dá um jeito. A vida é um ciclo, né? Eu perdi muita coisa, mas ganhei várias. Então, não pode perder a esperança”, reforça.
Para Luara, cozinhar é mais do que uma profissão: ‘A cozinha é um lar’.
Estevão Mamédio/g1
Recuperação em busca de autonomia
Maria Carolina Lima Garcia, terapeuta ocupacional e coordenadora assistencial do Serviço de Reabilitação Lucy Montoro, explica que recuperar ações básicas pode representar um avanço para quem passa por um processo de reabilitação.
“Quando nós falamos de autonomia, nós não nos recordamos de pequenas coisas do dia a dia. Quando nós acordamos, vamos ao banheiro, escovamos os dentes, trocamos de roupa… Isso é autonomia”, afirma.
A especialista destaca que o processo de reabilitação é individual e depende dos objetivos de cada paciente.
“Para muitas pessoas é importante voltar a cozinhar, para outras é importante voltar a pentear o cabelo ou voltar ao trabalho. Então, dependendo do que a pessoa quer ter autonomia, não depender do outro, é isso que nós vamos buscar”, explica.
Segundo Garcia, é possível retomar a autonomia mesmo que de forma adaptada. É possível que seja necessário o uso de algum recurso terapêutico, como cadeira de rodas, cadeira de banho ou um andador. “Mas isso não vai impedir que ela tenha função, que ela consiga se adaptar”, pondera a especialista.
Para a coordenadora, o envolvimento da família é essencial no processo de recuperação.
“No intuito de ajudar, a família acaba superprotegendo e não facilitando o processo de inclusão no ambiente domiciliar. Nosso objetivo é orientar esses familiares para estimular a pessoa a ter mais autonomia”, avalia.
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