Aeronave A321M Azul Linhas Aéreas
Azul Linhas Aéreas/Divulgação
Em meio a uma crise financeira, a Azul Linhas Aéreas é alvo de reclamações de descumprimento de normas trabalhistas, precarização das condições de trabalho de pilotos e tripulantes, e queda na remuneração. O g1 ouviu funcionários, o Sindicato Nacional dos Aeronautas (SNA) e teve acesso a uma ação civil pública que contesta medidas adotadas pela companhia.
O cenário atual tem levado à saída de diversos profissionais que, insatisfeitos, estariam migrando para outras empresas. Por conta do processo de recuperação judicial, aeronaves foram devolvidas e rotas canceladas, fazendo com que pilotos voassem menos.
A reportagem pediu um posicionamento à Azul sobre o assunto e aguarda resposta.
Ação civil pública
Na ação que tramita no Tribunal de Justiça do Trabalho da 15ª Região, o sindicato afirma que os funcionários vivem em “estado de prontidão”, pois são submetidos a constantes alterações de escalas de trabalho, redução de períodos de repouso e à invasão das folgas sem o consentimento deles.
Ao g1, a entidade disse, ainda, que a empresa tem submetido pilotos a jornadas exaustivas, cortes de benefícios e salários menores do que o oferecido pela concorrência.
📱 Baixe o app do g1 para ver notícias da região em tempo real e de graça
Um piloto mencionou uma “debandada” de co-pilotos, insatisfeitos com a queda na remuneração pela diminuição de voos. Segundo ele, foram cerca de 40 saídas apenas em setembro.
Ainda de acordo com o profissional, quando a Azul operava em capacidade máxima, a remuneração desses profissionais era de 25% a 30% maior que o salário-base.
O sindicato afirma que o cenário é “um reflexo do momento vivido pela empresa em meio ao processo de recuperação judicial e a atual crise de gestão de pessoas”.
Afirmou ainda que, nos últimos anos, “houve enorme degradação nas condições de trabalho dos pilotos da Azul, que passaram a sofrer com problemas de escala que impactam a vida pessoal”, pontuou em nota.
Um outro funcionário reforçou que a situação provoca um peso emocional no ambiente da empresa, que aponta ser mais grave que a carga de trabalho.
A companhia passa por um processo semelhante à recuperação judicial, chamado Capítulo 11 da Lei de Falências, nos Estados Unidos.
Ao menos sete audiências foram realizadas desde maio, quando o processo começou. Desde então, a Azul já encerrou rotas em ao menos 14 cidades e realizou o corte de 30 aeronaves para redução de custos.
De devolução de aeronaves paradas a aumento da receita, Azul se vê ‘mais leve’ e projeta saída de processo de recuperação judicial
Em agosto, John Rodgerson, CEO da Azul Linhas Aéreas, defendeu que a companhia sairia desse momento “mais leve”, sendo que a expectativa era deixar o processo de recuperação judicial até dezembro de 2025.
O processo
Na ação judicial, os aeronautas pedem que a Azul:
seja impedida de alterar as escalas de voos publicadas;
seja impedida de reduzir o descanso regulamentar;
consulte os tripulantes antes de qualquer alteração na escala;
seja impedida de aplicar sanções a quem se recusar a aceitar as alterações na jornada planejada.
O SNA pede ainda que, em caso de descumprimento das determinações, seja aplicada uma multa diária. O valor da ação é de R$ 200 mil em indenização por dano moral coletivo e dano existencial.
Havia um pedido de tutela de urgência, que foi indeferido pelo juiz do trabalho que recebeu a ação, “a fim de viabilizar o contraditório, para melhor averiguação dos fatos”.
Jornada exaustiva e benefícios cortados
Além do citado no processo, o Sindicato Nacional dos Aeronautas relatou ao g1 que os pilotos convivem com “escalas fatigantes ou alterações constantes em suas folgas, sendo rotineiras as mudanças de horário no início das folgas, de modo que o horário de chegada dos pilotos para reencontrar a família após cinco, seis dias fora de casa é alterado sem prévio consentimento”.
Há ainda reclamações sobre alterações e perda de direitos em temas relacionados a:
transporte na madrugada;
previdência privada;
diárias de alimentação;
precarização das condições de trabalho;
pioras significativas na alimentação a bordo e nos hotéis de pernoite.
Pilotos migrando para outras companhias
O órgão também destaca a política salarial da empresa como parte importante na insatisfação dos aeronautas.
“Atualmente a Azul é a que paga os piores salários entre as principais companhias aéreas. O salário base dos pilotos na Azul chega a ser até 24% menor do que nas concorrentes Gol e Latam”, pontuou o SNA.
Uma característica que também propicia essa movimentação, segundo o sindicato, é o fato de a Azul operar com aeronaves da Airbus, que também são utilizadas pela Latam. Isso facilitaria a migração dos pilotos entre companhias, pois a Latam poderia contratá-los “com economia no treinamento inicial, que é reduzido, proporcionando economia de tempo e dinheiro”.
“Agora, a Latam anunciou que vai passar a operar com Embraer, o que pode facilitar ainda mais a migração de pilotos, tendo em vista que a Azul também opera com aviões da Embraer. A Gol, embora não opere equipamentos similares aos da Azul, atualmente encontra-se em franca expansão e tem realizado contratações de tripulantes que buscam sair da empresa”.
Por fim, o SNA pontuou que “acompanha atentamente todas as movimentações e busca o diálogo com a Azul, para a resolução dos problemas, mas não tem obtido sucesso. O Sindicato reforça ainda que presta todo o apoio aos aeronautas demitidos, para que todos os direitos sejam preservados”.
Recuperação judicial
Em maio, a companhia aérea, que tem o principal hub em Campinas (SP), entrou com pedido de proteção sob o Capítulo 11 da Lei de Falências — mecanismo semelhante à recuperação judicial no Brasil. O objetivo é garantir a operação enquanto tenta eliminar uma dívida que chega a aproximadamente US$ 2 bilhões.
De acordo com informações do Tribunal dos Estados Unidos, o mecanismo permite que a empresa devedora mantenha todos os seus ativos, podendo continuar com a operação, negociar um possível adiamento de suas dívidas e, com aprovação judicial, obter um novo empréstimo, o que já foi definido na primeira audiência da recuperação judicial.
Em comunicado aos investidores, John Rodgerson, CEO da Azul, atribuiu as dificuldades financeiras da companhia à pandemia de Covid-19, às turbulências macroeconômicas e aos problemas na cadeia de suprimentos da aviação.
Rotas encerradas e corte de aeronaves
Ao longo do ano, a Azul fechou operações em, pelo menos, 14 cidades brasileiras que representavam 0,3% da receita líquida.
LEIA TAMBÉM:
Azul faz nova audiência de recuperação judicial nos Estados Unidos; saiba como está o processo
Após fim das negociações de fusão com a Gol, Azul diz que vai honrar passagens já emitidas
Entenda por que Azul diz que corte de até 30 aeronaves não afeta operações da companhia
Ações da Azul despencam com pedido de recuperação judicial nos EUA
VÍDEOS: Tudo sobre Campinas e Região
Veja mais notícias sobre a região na página do g1 Campinas.