Jurassic Park da vida real: paleontólogo inspirado pelo filme ajuda a recontar como era a vida no noroeste de SP há 80 milhões de anos


Museu de Paleontologia expõe fósseis de 12 mil anos em Fernandópolis
O fascínio por animais pré-históricos despertado quando criança por uma enciclopédia e inspirado pelo filme Jurassic Park (1993) é a motivação do trabalho do paleontólogo Carlos Eduardo Maia de Oliveira, de 52 anos.
Coordenador do Museu de Paleontologia de Fernandópolis (SP) e professor do Instituto Federal de São Paulo (IFSP) em Votuporanga (SP), ele dedicou as últimas duas décadas ao estudo dos vestígios deixados por vidas de milhões de anos e contabiliza descobertas surpreendentes na região noroeste de São Paulo.
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“Desde criança gosto de animais pré-históricos. Na década de 1980 era muito comum nossos pais comprarem aquelas enciclopédias com volumes gigantes e ficava ‘fuçando’ um só com animais. No fim do livro tinha um capítulo só sobre animais pré-históricos como mamute e dinossauros”, relembra.
Grupo liderado por Cadu comanda a busca por fósseis em Jales, Fernandópolis e Votuporanga
Arquivo pessoal / Carlos Eduardo Maia
Conhecido como Cadu, o paleontólogo encontrou na região um território fértil a ser explorado. Isso porque, conforme as pesquisas, os territórios onde hoje estão as cidades de Fernandópolis, Jales e Votuporanga eram terras semiáridas, com rios sinuosos, que tiveram a preservação de fósseis favorecida por um fenômeno geológico.
“Após a fragmentação da Gondwana, o supercontinente que unia a África e a América do Sul, houve um supervulcanismo que produziu um volume gigante de magma basáltico vindo das profundezas e fundou uma bacia que recebeu sedimentos como areia. O magma e a areia viraram rocha e hoje estão em fase de erosão, o que preservou e agora permite a exposição de ossos desses animais de 80 milhões de anos atrás”, celebra.
Em 2006, o paleontólogo Carlos Eduardo Maia encontrou fósseis de ovos de um crocodilo pré-histórico em Jales
Arquivo pessoal / Carlos Eduardo Maia
Segundo ele, um dos principais conjuntos históricos foi encontrado em 2006, na cidade de Jales: dezenas de ovos e cascas de ovos de crocodilos pré-históricos em um afloramento rochoso na zona rural.
“Por coincidência, em um domingo de Páscoa. Não eram os ovos do ‘coelhinho’, eram de crocodilos pré-históricos, ou seja, bem mais interessantes. O nome científico destes ovos foi criado pela nossa equipe de pesquisadores e passou a ser chamado, após publicarmos o trabalho em uma revista científica internacional, de Bauruoolithus fragilis”.
Já em 2010, Cadu e sua equipe encontraram em Fernandópolis um fóssil de um crocodilo pré-histórico juvenil, nomeado de Baurusuchus pachecoi. Era, segundo o pesquisador, um crocodilo terrestre, semelhante ao atual lagarto Dragão de Komodo. O estudo do espécime lhe rendeu uma tese de doutorado e um trabalho publicado na revista The Anatomical Record, publicação oficial da Sociedade Americana de Anatomia.
“Até o presente momento, é um dos espécimes juvenis mais preservados deste tipo de animal pré-histórico. Qualquer museu daria tudo para ter um fóssil daquele em seu acervo”, conta. “Os vertebrados maiores são mais difíceis de encontrar inteiros”.
Baurusuchus pachecoi era um crocodilo terrestre, semelhante ao atual lagarto Dragão de Komodo
Arquivo pessoal / Carlos Eduardo Maia
Museu expõe vestígios do passado local
Museu de Paleontologia foi instalado na antiga Estação Ferroviária de Fernandópolis
Arquivo pessoal / Carlos Eduardo Maia
Com tantas descobertas, até recentemente existia um problema: não havia um local adequado para a exposição dos fósseis na região. Assim, os vestígios encontrados acabavam sendo levados para São Paulo ou o Rio de Janeiro.
Com apoio do IFSP de Votuporanga e da Prefeitura de Fernandópolis, foi inaugurado em 2024 o Museu de Paleontologia de Fernandópolis “Prof. Cristóvão Souza de Oliveira”, instalado na antiga estação ferroviária do município, do qual Cadu é curador voluntário.
Museu de Paleontologia foi instalado na antiga Estação Ferroviária de Fernandópolis
Arquivo pessoal / Carlos Eduardo Maia
Ao todo, o acervo tem quase 300 peças fósseis em exibição e, além dos fósseis dos ovos e do Baurusuchus juvenil, o museu expõe mais dois crânios de Baurusuchus adultos, um encontrado em Fernandópolis e o outro encontrado em Jales. Os pesquisadores realizaram uma tomografia nos crânios e, por meio de uma técnica chamada endocast, reproduziram em impressão 3D o que era o encéfalo do crocodilo.
“Estudamos a sua anatomia e concluímos que as partes mais desenvolvidas dele eram as ligadas ao controle do olfato e da locomoção. O bicho era bom de faro e bom velocista, características importantes para um predador de topo de cadeia alimentar pré-histórica”, detalha Cadu.
Estudantes em visita ao Museu de Paleontologia de Fernandópolis
Arquivo pessoal / Carlos Eduardo Maia
Estão expostas, ainda, dezenas de réplicas, quatro painéis, quadros, rochas, geodos de quartzo e ametista e meteoritos, entre outras atrações. Todo o material serve de referência para novos estudos, e já foram utilizados em seis teses de doutorado, duas dissertações de mestrado e nove publicações em revistas científicas.
“É um trabalho árduo, mas tão gratificante que nem se sente. Após horas quebrando pedras no sol ou na chuva, a hora que se descobre um fóssil interessante, parecemos crianças quando ganhamos a primeira bicicleta. É uma aventura e me deixa muito orgulhoso que esse trabalho renda frutos para ouras gerações.”
Profissão: paleontólogo
Retirada de fósseis em campo exige até ferramentas grandes como martelete e gerador
Arquivo pessoal / Carlos Eduardo Maia
Uma das perguntas mais comuns feitas pelos estudantes durante as visitas ao museu é: “como ser um paleontólogo?” Carlos Eduardo explica que as graduações mais indicadas são biologia e geografia, com posterior especialização na ciência que estuda o passado geológico da Terra.
“Não existe faculdade de paleontologia, como biologia, medicina, mas sim o mestrado ou doutorado, e para isso, se requer o curso superior. Não importa qual, mas para facilitar, o ideal é que seja biologia, geologia ou geografia”, ensina ele, que é biólogo e tem doutorado em paleontologia pela Unesp de Rio Claro (SP).
E embora os dinossauros sejam, normalmente, os animais do passado que mais chamem a atenção, Cadu lembra que a pesquisa vai muito além deles.
“O paleontólogo trabalha com o estudo de vidas antigas. Os animais que viveram na Terra antes ou depois deles também são muito importantes, assim com as plantas, micro-organismos, pegadas, ovos, fezes fossilizadas. O paleontólogo, ao desvendar a vida no passado, ajuda a desvendar a evolução da Terra”, finaliza.
Pedaço de mandíbula de mosassauro de 68 milhões de anos e mesossauro de 154 milhões de anos
Arquivo pessoal / Carlos Eduardo Maia
Serviço
Museu de Paleontologia de Fernandópolis “Prof. Cristóvão Souza de Oliveira”
Entrada: gratuita
Funcionamento: de terça a sexta-feira, das 9h às 11h e das 13h às 17h; sábados, das 13h às 18h
Endereço: Rua João Gosselein, nº 1470, bairro Santa Rosa (antiga estação ferroviária de Fernandópolis)
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