‘Literatura para mim é um parque de diversões’: médico mineiro que venceu o Jabuti fala sobre obra e amor pela escrita


‘Literatura para mim é um parque de diversões’: médico mineiro que venceu o Jabuti fala sobre obra e paixão pela escrita
Redes sociais/Marcelo Henrique Silva
A literatura sempre esteve presente na vida do médico e escritor Marcelo Henrique Silva, de 32 anos. Natural de Passos (MG), ele era um menino diferenciado. “Sempre fui aquela criança que ficava na biblioteca no recreio”, conta. Porém, a escolha pela medicina afastou a escrita.
“Quando a gente vai chegando no ensino médio, começa essa pressão, essa cobrança de que você tem que fazer isso, tem que ser aquilo… E essa parte da literatura foi ficando pelo caminho”, explica o médico.
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Graduado pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Marcelo trabalhou por dois anos como médico generalista no programa Mais Médicos, atendendo em postos de saúde de bairros carentes em Passos.
Foi ali que teve contato com travestis e pessoas que vivem com HIV, experiências que, mais tarde, se tornariam base emocional e ética de seu primeiro livro. Hoje ele trabalha como médico radiologista especializado em oncologia, em Belo Horizonte (MG).
Marcelo Henrique Silva se formou em medicina pela Universidade Federal de Juiz de Fora em 2017
Redes sociais/Marcelo Henrique Silva
Antes de conquistar o Prêmio Jabuti 2025 com o romance Sangue Neon, na categoria Escritor Estreante, Marcelo trilhou um caminho de escuta, empatia e reencontro com a própria vocação. “Eu voltei a repensar sobre as minhas paixões. Foi nesse contexto que voltei a ler, principalmente literatura contemporânea brasileira”, diz.
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Inspiração para o livro
Em 2019, o autor viu na internet uma homenagem à travesti pernambucana Brenda Lee, criadora da primeira casa de apoio para pessoas com HIV na América Latina.
“Na hora que cliquei e vi aquela história, pensei: é fantástico! Essa travesti ganhar o Nobel da Paz pelo trabalho que fez! Eu fiquei obcecado e fui desenvolvendo uma pesquisa que acabou culminando com esse projeto de escrita”, explica.
Brenda Lee criou a primeira casa de apoio para pessoas com HIV na América Latina
Reprodução/RBS TV
Nascia ali Sangue Neon, romance ambientado entre os anos 1980 e 1990, período marcado pelo fim da ditadura, a redemocratização e o surgimento do HIV.
“O livro fala sobre esse processo de revolução e reforma sanitária no país, sobre os bastidores da criação do SUS, então, é um contexto histórico do povo, de pessoas que estão ali, na linha de frente, vivendo e enfrentando aquilo”.
Entre plantões e madrugadas, o jovem médico escreveu a obra ao longo de dois anos. Sem editora, decidiu inscrevê-la, sob pseudônimo, em um concurso nacional para novos escritores, promovido por uma editora carioca: Sangue Neon venceu o concurso e foi publicado em 2024.
Um ano depois, o romance levou o médico ao Prêmio Jabuti, disputado com mais de 4,5 mil obras inscritas. A vitória, diz Marcelo, veio como um alívio.
“Quando ouvi o nome do livro, respirei fundo. Não foi nem comemoração, foi alívio, um dever cumprido. Porque é uma história que fala de minorias, de travestis, de gente que raramente é lembrada nesses espaços”, ressalta.
Marcelo Henrique Silva venceu o Prêmio Jabuti 2025 na categoria Escritor Estreante com a obra Sangue Neon
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Sobre a obra
Inspirado em personagens reais, Sangue Neon traz figuras como Vera Lynn, personagem baseada em Brenda Lee, e o médico Itamar, inspirado no sanitarista Paulo Roberto Teixeira, pioneiro no enfrentamento ao HIV no país.
A obra também homenageia profissionais como Valéria Petri, médica que atendeu o primeiro caso de AIDS no Brasil, e cidadãos anônimos que lutaram para garantir o direito à saúde pública.
Paulo Roberto Teixeira e Valéria Petri também foram inspirações para o livro de Marcelo
Governo de São Paulo/Redes sociais
O título do livro nasceu de uma metáfora poderosa. Marcelo conta que travestis usavam o próprio sangue como forma de defesa contra a violência, erguendo-o “como um escudo”.
“O nome do livro veio dessa metáfora do sangue, como algo que não é só biológico, que também representa muito bem esse preconceito, esse estigma, mas também força”.
Para ele, o principal legado de Sangue Neon é o exercício da empatia.
“Existe luz e luta nas pessoas que a gente muitas vezes vira o olho, que a gente acha que procura o problema, a doença, mas é o contrário. Eu vejo o livro como um exercício de empatia e de valorizar o nosso SUS, nossa saúde pública, defender sempre o olhar atento àqueles que são diferentes”.
Próximos trabalhos
Com o reconhecimento gerado pelo prêmio, o autor já prepara um livro de contos e pretende explorar novos gêneros, como poesia e crônicas. “Eu quero aprender, apurar minha técnica, ver aonde eu me encaixo melhor e continuar brincando, porque também é uma brincadeira para mim, que sou médico”, diz.
“Meu trabalho às vezes é tão pesado, e a literatura para mim é um parque de diversões, é o momento onde eu tenho para me exercitar, uma terapia”, completa Marcelo.
Marcelo Henrique Silva e os ganhadores do Prêmio Jabuti 2025
Redes sociais/Marcelo Henrique Silva
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