Foto fornecida pela Catalent mostra a formulação de LSD da MindMed, da Catalent.
Catalent via AP
O LSD reduziu os sintomas de ansiedade em um estudo de fase intermediária publicado nesta quinta-feira (4), abrindo caminho para testes adicionais e uma possível aprovação médica de uma droga psicodélica proibida nos Estados Unidos há mais de meio século.
Os resultados da farmacêutica Mindmed testaram várias doses de LSD em pacientes com transtorno de ansiedade generalizada, de moderado a grave, com benefícios que duraram até três meses. A empresa planeja realizar estudos de acompanhamento para confirmar os resultados e, em seguida, solicitar a aprovação da Food and Drug Administration (FDA).
A partir da década de 1950, pesquisadores publicaram uma série de artigos explorando os usos terapêuticos do LSD, embora a maioria deles não atenda aos padrões modernos.
“Vejo este artigo como um passo claro na direção de reviver essa pesquisa antiga, aplicando nossos padrões modernos e determinando quais são os reais custos e benefícios desses compostos”, disse Frederick Barrett, que dirige o centro psicodélico da Universidade Johns Hopkins e não esteve envolvido na pesquisa.
A pesquisa psicodélica está se recuperando
Os psicodélicos estão passando por um retorno popular e científico, com conferências, documentários, livros e periódicos médicos explorando seu potencial para condições como depressão, ansiedade e transtorno de estresse pós-traumático (TEPT).
A FDA designou a psilocibina, o MDMA e agora o LSD como potenciais terapias “inovadoras” com base em resultados iniciais.
Ainda assim, os medicamentos não tiveram um caminho fácil para o mercado.
No ano passado, a FDA rejeitou o MDMA — também conhecido como ecstasy — como tratamento para TEPT, citando métodos de estudo falhos, potencial viés de pesquisa e outras questões.
O novo estudo sobre o LSD, publicado pelo Journal of the American Medical Association, aborda alguns desses problemas.
O MDMA, como muitos outros psicodélicos, foi testado em combinação com horas de terapia por profissionais de saúde treinados. Essa abordagem se mostrou problemática para os revisores da FDA, que disseram ser difícil separar os benefícios do medicamento dos benefícios da terapia.
O estudo sobre LSD adotou uma abordagem mais simples: os pacientes receberam uma única dose de LSD — sob supervisão profissional, mas sem terapia — e foram acompanhados por cerca de três meses.
O artigo não detalha como os pacientes foram preparados para a experiência ou que tipo de acompanhamento receberam, o que é crucial para a compreensão da pesquisa, observou Barrett.
“Em muitos casos, as pessoas podem ter experiências tão intensas e subjetivas que podem precisar conversar com um terapeuta para ajudá-las a entendê-las”, disse ele.
Ansiedade diminuiu, mas ainda há dúvidas
Para o estudo, os pesquisadores mediram os sintomas de ansiedade em quase 200 pacientes que receberam aleatoriamente uma de quatro doses de LSD ou um placebo. O objetivo principal era encontrar a dose ideal da droga, que pode causar alucinações visuais intensas e, ocasionalmente, sentimentos de pânico ou paranoia.
Em quatro semanas, os pacientes que receberam as duas doses mais altas apresentaram escores de ansiedade significativamente mais baixos do que aqueles que receberam placebo ou doses menores. Após 12 semanas, 65% dos pacientes que tomaram a dose mais eficaz de LSD — 100 miligramas — continuaram a apresentar benefícios e quase 50% foram considerados em remissão. Os efeitos colaterais mais comuns incluíram alucinações, náuseas e dores de cabeça.
Os pacientes que receberam pílulas falsas também apresentaram melhora — um fenômeno comum em estudos psicodélicos e psiquiátricos —, mas suas alterações foram menos da metade daquelas observadas em estudos com a droga real.
A pesquisa não foi imune a problemas observados em estudos semelhantes.
A maioria dos pacientes conseguiu adivinhar corretamente se havia recebido LSD ou uma pílula falsa, contrariando a abordagem “cega” considerada crucial para estabelecer objetivamente os benefícios de um novo medicamento. Além disso, uma parcela significativa de pacientes, tanto no grupo placebo quanto no grupo de tratamento, abandonou o tratamento precocemente, reduzindo o conjunto final de dados.
Também não estava claro por quanto tempo os pacientes poderiam continuar se beneficiando.
A Mindmed está conduzindo dois grandes ensaios clínicos em estágio avançado que acompanharão os pacientes por um período mais longo e, se bem-sucedidos, serão submetidos à aprovação da FDA.
“É possível que algumas pessoas precisem de retratamento”, disse o Dr. Maurizio Fava, do Hospital Mass General Brigham, principal autor do estudo e consultor da Mindmed. “Ainda não sabemos quantos retratamentos serão necessários, mas o efeito duradouro é bastante significativo.”
Interesse do governo Trump
O secretário de Saúde, Robert F. Kennedy Jr., e outros funcionários do governo expressaram interesse na terapia psicodélica, sugerindo que ela poderia receber uma revisão rápida para veteranos e outras pessoas que sofrem de traumas psicológicos.
O transtorno de ansiedade generalizada está entre os transtornos mentais mais comuns, afetando quase 3% dos adultos nos EUA, de acordo com os Institutos Nacionais de Saúde. Os tratamentos atuais incluem psicoterapia, antidepressivos e ansiolíticos, como benzodiazepínicos.
A possibilidade de usar LSD como tratamento médico não é nova.
Nas décadas de 1950 e 1960, mais de 1.000 artigos foram publicados documentando o uso de LSD no tratamento de dependência de álcool, depressão e outras condições. Mas uma reação negativa federal estava a todo vapor no final da década de 1960, quando os psicodélicos foram associados a figuras da contracultura como Timothy Leary, o ex-professor de Harvard que ficou famoso por promover as drogas como um meio de “ligar, sintonizar e largar”.
Uma lei de 1970 que classificava o LSD e outros psicodélicos como drogas da Lista 1 — sem qualquer uso medicinal e com alto potencial de abuso — basicamente interrompeu as pesquisas nos EUA.
Quando algumas organizações sem fins lucrativos começaram a reavaliar as drogas nas décadas de 1980 e 1990, concentraram-se em alucinógenos menos conhecidos, como o MDMA e a psilocibina, o principal ingrediente dos cogumelos mágicos, para evitar as controvérsias históricas em torno do LSD.
“O LSD estava ali, na frente de todos, mas a Mindmed foi a primeira empresa que realmente decidiu avaliá-lo”, disse Fava.
O Departamento de Saúde e Ciência da Associated Press recebe apoio do Departamento de Educação Científica do Instituto Médico Howard Hughes e da Fundação Robert Wood Johnson. A AP é a única responsável por todo o conteúdo.
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