Na ONU, Lula condena ataques a instituições e à economia brasileiras e defende democracia e soberania do país


Começou nesta terça-feira (23), em Nova York, a Assembleia Geral das Nações Unidas, e o presidente do Brasil cumpriu o protocolo histórico de ser o primeiro a discursar. Lula não mencionou explicitamente as taxas de importação de 50% impostas pelos Estados Unidos. Mas, ao condenar os ataques às instituições e à economia do Brasil, deixou subentendida a crítica à ação do governo Trump em defesa das big techs americanas e de Jair Bolsonaro.
Assim que chegou à ONU, o presidente Lula se encontrou com o secretário-geral, António Guterres, antes do discurso no plenário. Como já é tradição, o presidente do Brasil é o primeiro chefe de Estado a falar na Assembleia Geral da ONU. Só que, dessa vez, o discurso teve um peso ainda maior. É que o Brasil é o país – ao lado da Índia – alvo das maiores tarifas anunciadas até aqui pelo governo americano.
Lula começou seu discurso afirmando que a autoridade da ONU está em xeque e relacionou a crise do sistema internacional a ataques à democracia:
“Atentados à soberania, sanções arbitrárias e intervenções unilaterais estão se tornando regra. Em todo o mundo, forças antidemocráticas tentam subjugar as instituições e sufocar as liberdades. Cultuam a violência, exaltam a ignorância, atuam como milícias físicas e digitais, e cerceiam a imprensa. Mesmo sob ataque sem precedentes, o Brasil optou por resistir e defender sua democracia, reconquistada há 40 anos pelo seu povo, depois de duas décadas de governos ditatoriais”.
Lula discursa na Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York
Jornal Nacional/ Reprodução
Lula não citou nominalmente os Estados Unidos ou o presidente Donald Trump, nem usou a palavra “tarifaço” no discurso, mas criticou ataques à economia brasileira e tentativas de interferir no Judiciário brasileiro:
“Não há justificativa para as medidas unilaterais e arbitrárias contra nossas instituições e nossa economia. A agressão contra a independência do Poder Judiciário é inaceitável”.
O presidente rejeitou a possibilidade de anistia:
“Essa ingerência em assuntos internos conta com o auxílio de uma extrema direita subserviente e saudosa de antigas hegemonias. Falsos patriotas arquitetam e promovem publicamente ações contra o Brasil. Não há pacificação com impunidade”.
Lula discursa na Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York
Jornal Nacional/ Reprodução
Na sequência, sem mencionar diretamente o nome de Jair Bolsonaro, Lula lembrou a condenação do ex-presidente no STF – Supremo Tribunal Federal:
“Pela primeira vez em 525 anos de nossa história, um ex-chefe de Estado foi condenado por atentar contra o Estado Democrático de Direito. Foi investigado, indiciado, julgado e responsabilizado pelos seus atos em um processo minucioso. Teve amplo direito de defesa, prerrogativa que as ditaduras negam às suas vítimas. Diante dos olhos do mundo, o Brasil deu um recado a todos os candidatos a autocratas e àqueles que os apoiam: nossa democracia e nossa soberania são inegociáveis”.
Na plateia, estavam o secretário de Estado americano, Marco Rubio, e o secretário do Tesouro, Scott Bessent, que na segunda-feira (22) anunciou sanções contra a esposa do ministro do STF Alexandre de Moraes.
O presidente Lula defendeu também a regulamentação das plataformas digitais:
“A internet não pode ser ‘terra sem lei’. Cabe ao poder público proteger os mais vulneráveis. Regular não é restringir a liberdade de expressão. É garantir que o que já é ilegal no mundo real seja tratado assim também no ambiente virtual. Ataques à regulação servem para encobrir interesses escusos e dar guarida a crimes, como fraudes, tráfico de pessoas, pedofilia e investidas contra a democracia”.
Sobre o conflito na Ucrânia, Lula disse que uma solução realista deve levar em conta preocupações de todas as partes, o que equipara o país invasor, a Rússia, ao invadido, a Ucrânia.
“No conflito na Ucrânia, todos já sabemos que não haverá solução militar. É preciso pavimentar caminhos para uma solução realista. Isso implica levar em conta as legítimas preocupações de segurança de todas as partes”, disse Lula.
Lula discursa na Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York
Jornal Nacional/ Reprodução
Ao falar sobre a guerra em Gaza, o presidente condenou os ataques terroristas de 7 de outubro de 2023, mas não citou os reféns que continuam nas mãos do Hamas. E, mais uma vez, classificou a resposta de Israel como genocídio:
“Nenhuma situação é mais emblemática do uso desproporcional e ilegal da força do que a da Palestina. Os atentados terroristas perpetrados pelo Hamas são indefensáveis sob qualquer ângulo. Mas nada, absolutamente nada, justifica o genocídio em curso em Gaza. Quero expressar minha admiração aos judeus que, dentro e fora de Israel, se opõem a essa punição coletiva. O povo palestino corre o risco de desaparecer. Só sobreviverá como um Estado independente e integrado à comunidade internacional”.
Durante o discurso, as cadeiras da delegação de Israel ficaram vazias.
O presidente citou a COP 30 – a Conferência do Clima da ONU, que será realizada em novembro, em Belém – e cobrou mais financiamento dos países ricos para o combate às mudanças climáticas:
“A COP 30, em Belém, no Brasil, será a COP da verdade. Será o momento de os líderes mundiais provarem a seriedade de seu compromisso com o planeta. Exigir maior ambição e maior acesso a recursos e tecnologias não é uma questão de caridade. É apenas uma questão de justiça”.
Lula concluiu com uma defesa das organizações internacionais:
“No futuro que o Brasil vislumbra, não há espaço para a reedição de rivalidades ideológicas ou esferas de influência. O século 21 será cada vez mais multipolar. Para se manter pacífico, não pode deixar de ser multilateral”.
Na comitiva americana, os aplausos vieram do secretário do Tesouro, Scott Bessent. O governo brasileiro disse que Trump assistiu a Lula em uma sala, enquanto esperava para discursar.
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