
As 10 vítimas do incêndio no CT do Flamengo
Roberta Jaworski/G1
O Ministério Público estadual do Rio de Janeiro apelou à 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça pela condenação de 7 réus que seriam, segundo a promotoria, responsáveis pelo incêndio que levou à morte de 10 jovens atletas das categorias de base do Flamengo no centro de treinamento do clube, o Ninho do Urubu, na Zona Sudoeste do Rio.
A apelação do Ministério Público estadual foi anexada, na tarde desta segunda (10), ao processo que apura o caso.
Os réus que estão no processo e foram absolvidos pela 36ª Vara Criminal são:
Antônio Marcio Mongelli Garotti, diretor-financeiro (CFO) do Flamengo;
Marcelo Maia de Sá, engenheiro civil e diretor-adjunto de Patrimônio do Flamengo;
Claudia Pereira Rodrigues, diretora administrativa e comercial da Novo Horizonte Jacarepaguá, a NHJ, responsável pela instalação dos contêineres;
Danilo da Silva Duarte, engenheiro de Produção na Diretoria Operacional da NHJ;
Fabio Hilario da Silva, engenheiro eletricista na NHJ;
Weslley Gimenes, engenheiro civil na NHJ;
Edson Colman da Silva, sócio-proprietário da Colman Refrigeração, responsável pela instalação dos aparelhos de ar condicionado no CT.
O documento foi assinado pela promotora Ana Cristina Fernandes Villela e por promotores do Grupo de Atuação Especializada em Combate à Sonegação Fiscal e aos Ilícitos contra a Ordem Tributária (Gaesf) e do Grupo de Atuação Especializada do Desporto e Defesa do Torcedor (Gaedest).
O grupo de promotores recorreu da decisão do juiz Tiago Fernandes de Barros, da 36ª Vara Criminal do TJ que absolveu os réus. Em sua decisão, em outubro passado, o magistrado afirma que o MP formulou a denúncia de forma genérica e contraditória.
Segundo a decisão, a perícia não alcançou o grau de certeza exigido pelo Direito Penal. Ainda de acordo com o juiz, quando a dúvida nasce do próprio saber especializado, a absolvição é não apenas justa, mas juridicamente necessária.
O magistrado apontou algumas das contradições. Segundo ele, a acusação defendeu a tese de que houve falha na manutenção feita por um técnico em refrigeração dois dias antes. Mas, de acordo com o juiz, o reparo não foi feito no equipamento que pegou fogo.
Para o magistrado, a prova é clara ao demonstrar que o reparo por ele executado não se relacionou com aquele do quarto 6, foco inicial do fogo. O conserto, de acordo com a sentença, ocorreu nos quartos 2 ou 3.
Outro ponto levantado na sentença foi a falta de investigação de informações que surgiram ao longo do processo. Segundo depoimentos e perícias, as instalações do Ninho apresentavam falhas estruturais graves, como: disjuntores superdimensionados, cabos subdimensionados e ausência de desligamento automático em caso de sobrecarga.
Na apelação, os promotores rebatem os argumentos da absolvição e pedem que os desembargadores revisem a decisão:
“A absolvição proferida em primeiro grau baseou-se em uma equivocada percepção de dúvida, que não encontra amparo na prova técnica nem na lógica dos fatos. O incêndio que vitimou dez jovens atletas e feriu gravemente outros três não foi um acidente imprevisível, mas o produto direto de omissões conscientes e reiteradas de agentes que tinham o dever jurídico e profissional de impedir o resultado”.
Os promotores pedem que os integrantes da 3ª Câmara analisem o caso e determinem:
A mudança da sentença que absolveu os réus para reconhecer a materialidade, a autoria e a culpa dos suspeitos;
No caso dos réus que tiveram a punibilidade extinta, o MP pede que seja declarada a responsabilidade penal mantendo-se assim o reconhecimento judicial da culpa como elemento essencial à verdade e à tutela de memória das vítimas;
Que seja reavaliada as provas técnicas, documentais e de testemunhas, reconhecendo a conduta dos réus caracterizada, segundo a Justiça, por “negligência” e “imperícia”, o que supera o juízo de dúvida formulado na sentença;
Que seja reconhecida a culpa e reformada a sentença, além de se fixar um mínimo de indenização para cada família das vítimas;
Que a decisão do tribunal reafirme o compromisso constitucional do Estado e da sociedade com a proteção da Criança e do Adolescente
A análise da apelação do MP pela 3ª Câmara Criminal do TJ ainda não tem data para acontecer.
Relembre o caso
Incêndio no Ninho do Urubu: relembre o caso
Os jovens dormiam dentro de um contêiner, uma instalação provisória, quando o fogo começou. A suspeita é que o incêndio tenha começado após um curto-circuito em um ar-condicionado, que ficava ligado 24 horas por dia no local. O fogo se alastrou devido ao material do contêiner, segundo a investigação.
Na época do incêndio, o Ninho do Urubu não tinha alvará de funcionamento, segundo a Prefeitura do Rio.
Todas as vítimas foram identificadas: eram atletas da base do time – tinham entre 14 e 16 anos. Três pessoas também ficaram feridas.
Onze pessoas respondiam pelos crimes de incêndio culposo qualificado com resultado morte de 10 pessoas e lesão corporal grave em 3 vítimas.
Entre os réus estavam o ex-presidente do clube, Eduardo Carvalho Bandeira de Mello, os então diretores do time Antonio Marcio Mongelli e Garotti e Carlos Renato Mamede Noval, representantes de empresas que prestavam serviços e o monitor dos atletas de base do Flamengo.
Sete réus foram absolvidos pelo juiz Tiago Fernandes e outros quatro já tinham tido decisões favoráveis antes.
Luiz Felipe Almeida Pondé, engenheiro contratado para concluir as obras do CT1 vinculado à Diretoria de Patrimônio (Justiça rejeitou a denúncia do MPRJ);
Carlos Renato Mamede Noval, diretor da base do Flamengo (Justiça rejeitou a denúncia do MPRJ);
Marcus Vinicius Medeiros, monitor noturno do alojamento (absolvido sumariamente, com decisão mantida após recurso);
Eduardo Carvalho Bandeira de Mello, presidente do Flamengo na época da instalação dos contêineres (Bandeira não foi absolvido, ele teve extinta a possibilidade de ser punido porque a denúncia do MP prescreveu e pela idade avançada do ex-dirigente).