Policial penal é preso após dar tiro em entregador
“O cara foi preso, graças a Deus.”
O entregador Valério Junior falou ao Bom Dia Rio sobre a prisão do policial penal José Rodrigo da Silva Ferrarini, que lhe atirou no pé ao deixar um lanche na última sexta-feira (29).
“Agora eu me sinto mais tranquilo de poder resolver essas questões, de poder andar na rua, e deixar a Justiça fazer jus”, declarou.
Até a última atualização desta reportagem, o projétil ainda estava alojado no pé direito de Valério — ele foi atendido de emergência após levar o tiro e foi liberado sem que o removessem.
Valério aguarda a reavaliação — enquanto isso, lamenta não poder trabalhar. “Vai depender de o médico falar se dá para tirar, se continua, se tem sequela ou não”, afirmou.
“Eu recebia R$ 7 para tomar um tiro no pé”, lembrou.
‘Disparo acidental’
Ferrarini alegou à polícia que o disparo foi acidental — versão sustentada antes e depois da prisão, segundo afirmou o delegado Marcos Buss, da 32ª DP (Taquara).
Buss contou ao Bom Dia Rio que, antes de o caso ganhar repercussão, o próprio Ferrarini procurou a polícia para comunicar o fato. “Ele admitiu que se envolveu numa discussão com o entregador porque ele não teria se disposto a levar o lanche na casa dele. Em dado momento dessa discussão, segundo ele, a arma dele disparou acidentalmente e atingiu o motoboy”, narrou.
Por essa razão, Ferrarini acabou liberado após esse depoimento. As imagens de Valério viralizaram, e Buss decidiu pedir a prisão do agente. O mandado foi expedido pelo Plantão Judiciário e cumprido na tarde de domingo.
“Até o momento, ele mantém a alegação de que o disparo teria sido acidental. Tão logo tivemos contato com as imagens do fato, constatamos que, pela própria dinâmica, esse disparo foi voluntário”, disse Buss.
“Uma pessoa que aponta uma arma de fogo para outra, seja em qualquer parte do corpo, e puxa o gatilho no mínimo assume o risco de causar a morte”, declarou o delegado.
O policial penal José Rodrigo da Silva Ferrarini foi preso por agentes da 32ª DP (Taquara)
Reprodução/TV Globo
Afastamento do cargo
Antes de Ferrarini ser preso, a Secretaria Estadual de Administração Penitenciária (Seap) informou que o afastou por 90 dias e, em nota, declarou a conduta do servidor como “abominante”.
“A Polícia Penal não compactua em hipótese alguma com atitude como essa, atitude repugnante e que não representa a grande maioria dos policiais penais do Rio de Janeiro”, declarou a secretária Maria Rosa Nebel. “A corregedoria da Seap está acompanhando o caso junto à delegacia de polícia, e nos solidarizamos com o entregador Valério Júnior”, emendou.
Um processo administrativo disciplinar foi aberto contra Ferrarini.
✅Clique aqui para seguir o canal do g1 RJ no WhatsApp
Cliente atira no pé de entregador na Zona Oeste do Rio
Relembre o caso
A confusão ocorreu na Rua Carlos Palut, no conjunto de prédios conhecidos como Merck — são vizinhos à fábrica.
O entregador Valério Junior chega ao endereço e avisa a Ferrarini para buscar o pedido no portão do condomínio. O agente exige que Valério suba até o apartamento, o que é negado.
O policial penal, então, vai ao encontro de Valério, que passa a gravar a conversa. “Você não subir é uma parada!”, reclamou Ferrarini. Valério começa a relatar a situação no vídeo. “Tá OK. Estou na Merck…”, narra — mas é interrompido por Ferrarini, que atira no pé direito do entregador.
“Então valeu!”, respondeu o policial, enquanto Valério se contorce de dor. “Que isso, cara!?”, questiona o motoboy. “Que isso é o c*ralho”, repete Ferrarini. “Bora, me dá minha parada!”, exige o policial. “Tá me filmando por quê, p*rra!?”, pergunta o agente.
Valério, já com o pé ensanguentado, diz ser vizinho do policial. “Eu moro aqui, cara! Eu sou morador, cara!”, suplica. O entregador então grita por ajuda e parece chamar um porteiro: “Ô, Tião! Me ajuda aqui, Tião! Ele me deu um tiro, Tião! Chega aí, Tião! Sou eu, Valério!”
Ferrarini dá as costas ao baleado e volta para casa, com o lanche.
Valério foi atendido de emergência e liberado com a bala alojada.
Momento em que José Rodrigo da Silva Ferrarini atira em Valério Júnior
Reprodução/TV Globo
‘R$ 7 para tomar um tiro no pé’
Ao RJ2 de sábado, Valério deu detalhes do caso.
“Ele [Ferrarini] falou que não ia lá, mandou buscar no bloco, e eu falei que não. Disse para me encontrar na portaria”, lembrou.
“Quando ele veio, ele já veio alterado. Falei: ‘Cara, fica tranquilo, fica tranquilo, eu só preciso do código’. Ele falou: ‘Me dá o pedido’!’ Eu falei: ‘Não. Me dá o código, que eu te dou o pedido’. Eu recebia R$ 7 para tomar um tiro no pé”, contou Valério.
Ele não sabe quando poderá voltar a trabalhar porque o projétil ficou alojado. “Vai depender do médico falar se dá para tirar, se continua, se tem sequela ou não. Vou ficar sem trabalhar por isso”, afirmou.
Entregadores se uniram para fazer um protesto na porta do condomínio. Eles se disseram indignados pelo fato de o atirador ter sido ouvido e liberado na delegacia após depor.
“Uma injustiça, a gente só queria o direito de ir e vir e entregar o lanche do cliente em segurança”, afirmou o entregador Breno Pereira.
O que diz o iFood
A empresa reforçou que os entregadores não são obrigados a levar até a porta dos apartamentos e disse que não tolera nenhum tipo de violência contra os entregadores parceiros. Veja a nota na íntegra:
“O iFood não tolera qualquer tipo de violência contra entregadores parceiros e lamenta muito o acontecido com o entregador Valério de Souza Junior. A empresa conta com uma Política de Combate à Discriminação e à Violência para oferecer a todos um ambiente ético, seguro e livre de qualquer forma de violação de direitos. Quando as regras são descumpridas, são aplicadas sanções que podem ir desde advertências até o banimento da plataforma.
O iFood esclarece também que a obrigação do entregador é deixar o pedido no primeiro ponto de contato, seja o portão da casa ou a portaria do prédio. Essa é a recomendação passada aos entregadores e aos consumidores. Em 2024, a empresa lançou no Rio de Janeiro a campanha Bora Descer, que tem o objetivo de incentivar os clientes a irem até a portaria de seus condomínios para receber os pedidos de delivery, como forma de respeito aos entregadores.
O iFood vai disponibilizar ao entregador Valério os serviços da Central de Apoio Jurídico e Psicológico, oferecido em parceria com a organização de advogadas negras Black Sisters in Law, garantindo acesso à justiça e assistência emocional ao parceiro. A empresa está à disposição das autoridades para colaborar no que for necessário.
Esperamos que o caso não fique impune e que Valério Junior se recupere rapidamente.”