
François Bayrou, nomeado por Macron primeiro-ministro da França, em agosto de 2024.
Dimitar Dilkoff/ AFP
O primeiro-ministro da França, François Bayrou, perdeu o voto de confiança do Parlamento nesta segunda-feira (8), o que aprofundou a crise política do governo de Emmanuel Macron.
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Ainda não está claro se o presidente francês, Emmanuel Macron, dissolverá o Parlamento para convocar novas eleições.
Em discurso antes da votação, o premiê se defendeu e pediu união para encarar desafios do país como a necessidade de controle dos gastos:
“Membros do Parlamento, vocês têm o poder de derrubar o governo, mas não têm o poder de apagar a realidade. A questão vital, a questão de vida ou morte, onde nossa própria sobrevivência está em jogo… é a questão de controlar nossos gastos, é a questão do superendividamento. Nosso país tem uma necessidade urgente de lucidez, tem a necessidade mais urgente de unidade. Mas é a divisão que ameaça prevalecer, que ameaça sua imagem e reputação”.
Marine Le Pen, representante da extrema direita na Assembleia Nacional, fez críticas duras a Bayrou e também ao presidente francês, Emmanuel Macron, e afirmou que o “poder legislativo está paralisado pela falta de maioria”.
“É uma época em que os responsáveis são forçados a revelar os resultados desastrosos de cinco décadas de gestão perdulária. O lamentável espetáculo de um colapso para o país, um desastre para o povo francês. As consequências afetarão as gerações futuras da nação. O país vive uma crise social latente que pode eclodir a qualquer momento”, disse.
Boris Vallaud, presidente do Partido Socialista, também atacou Macron: “Só há uma pessoa responsável pela crise, pelo desastre e pela agitação no nosso país: o presidente da república e seus seguidores cegos, dos quais você, primeiro-ministro, é o principal defensor”.
O resultado da votação no Parlamento deve causar a renúncia de Bayrou, o quarto premiê da França em menos de dois anos, e mergulha a segunda maior economia da zona do euro em uma paralisia política e econômica ainda mais profunda.
A queda do governo minoritário encabeçado pelo premiê Bayrou agrava os problemas da França em um momento crítico para a Europa, que busca unidade diante da guerra da Rússia contra a Ucrânia, de uma China cada vez mais dominante e de tensões comerciais com os Estados Unidos. A França é a 2ª maior economia da União Europeia.
A turbulência também ameaça a capacidade da França de controlar sua dívida, com o risco de novos rebaixamentos de crédito à medida que os bond spreads — indicador do prêmio de risco exigido pelos investidores para manter títulos franceses — se ampliam.
A França enfrenta forte pressão para consertar suas finanças: no ano passado, o déficit foi quase o dobro do limite de 3% do PIB estabelecido pela União Europeia, e a dívida pública atingiu 113,9% do PIB.
A votação de confiança está marcada para a tarde de segunda-feira, após um debate a partir das 15h (13h GMT), com um discurso inicial de Bayrou, seguido pelos líderes de todos os grupos políticos. O resultado deve sair por volta das 17h GMT.
Líderes da oposição em todo o espectro político deixaram claro que manterão seus planos de derrubar Bayrou.
“Quero dizer como estou feliz que o governo vá cair hoje. Para muitos franceses, é um alívio”, disse Manuel Bompard, da França Insubmissa (extrema-esquerda), à emissora franceinfo, em sintonia com declarações de outros partidos.
Caso Bayrou realmente caia, o presidente Emmanuel Macron terá provavelmente de encontrar mais uma vez um novo chefe de governo capaz de conduzir um orçamento pelo Parlamento, menos de um ano após a queda do antecessor conservador de Bayrou, Michel Barnier.
As tensões sociais também estão em alta. Vários grupos nebulosos surgidos online convocaram os franceses a “parar tudo” nesta quarta-feira, enquanto os sindicatos tradicionais planejam uma mobilização em 18 de setembro contra os planos de cortes orçamentários.
Guinada à esquerda?
Macron descartou, até agora, dissolver o Parlamento, como fez no ano passado. A França está mergulhada em crise política desde aquela eleição antecipada, que resultou em um Parlamento ainda mais dividido.
A aliança de Macron, que já havia perdido a maioria desde 2022, encolheu ainda mais, enquanto o Reagrupamento Nacional (extrema-direita, anti-imigração) se tornou o maior partido. Uma coalizão frouxa de partidos de esquerda, agora profundamente dividida, ficou com o maior bloco, mas nenhum campo tem maioria.
“Essa crise foi provocada e alimentada pelo presidente Emmanuel Macron e todos aqueles que o serviram”, disse no domingo Marine Le Pen, líder da bancada do Reagrupamento Nacional. “Hoje, o homem doente da Europa, por causa deles, é a França.”
Após a queda de um conservador e de um centrista no cargo de primeiro-ministro, muitos analistas esperam que Macron busque agora um candidato entre as fileiras dos socialistas (PS, centro-esquerda).
Qualquer candidato desse perfil enfrentaria enormes desafios e ainda teria de construir uma delicada aliança com o bloco liberal do presidente, que se opõe a muitas ideias da esquerda, como o aumento de impostos para os mais ricos a fim de cobrir o rombo nas contas públicas. Também precisaria convencer a direita moderada a tolerar mais um governo minoritário.
Laurent Wauquiez, líder parlamentar dos conservadores Les Républicains (LR), sinalizou que não pediria a queda de um primeiro-ministro socialista. Mas o presidente do partido e ministro do Interior, Bruno Retailleau, discordou.
“Não há chance de aceitarmos um primeiro-ministro socialista”, disse Retailleau no domingo.
Como muitos na França, Mohamed, de 80 anos, vendedor de frutas e verduras no mercado de Aligre, em Paris, não acredita que os políticos encontrarão uma saída.
“Volte em 10 dias e verá que nada terá mudado. Não haverá maioria, não haverá orçamento.”